A propaganda sionista de “O Brutalista” ou ‘Ninguém é mais escravo do que aquele que se julga livre’

Especial Roni Filgueiras

Logo nos primeiros minutos de “O Brutalista”, o diretor Brady Corbet (“Vox Lux”) acompanha com sua câmera o arquiteto húngaro László Tóth (Adrien Brody). Flagrado num local escuro, claustrofóbico, Tóth se apressa, no meio de outros refugiados judeus de campos de extermínio nazistas, para chegar à saída.
A saída, logo saberemos, é o porto de Nova York, onde a primeira visão é a Estátua da Liberdade em um ângulo que vai dar a tônica do filme: uma realidade revirada, de cabeça para baixo. Como o mundo estava no pós-guerra, em 1947.
E acrescentaria: a questão da liberdade é um dos temas de fundo do longa dirigido pelo jovem ator americano que estrelou o brilhante “Funny Games” (Michael Haneke) e escrito por ele em parceria com a cineasta norueguesa Mona Fastvold.


Um parênteses: o personagem Tóth baseou-se nos arquitetos brutalistas Ernő Goldfinger e Marcel Breuer, criadores polêmicos e imaginativos, atuantes no pós-guerra; e no geólogo húngaro, do qual tomou emprestado o nome. O verdadeiro László Tóth acabou seus dias mais conhecido como o louco que acreditava ser Jesus Cristo e vandalizou a Pietà, obra de Michelangelo, no Vaticano.
Talvez a intenção do diretor seja publicizar isso mesmo: para criar o novo é necessário destruir ou suplantar o que estava posto. Sabe-se lá o que é esse novo…
Ao pisar na Terra Prometida, Tóth vai trabalhar e morar com o primo Attila (Alessandro Nivola), um judeu convertido, e sua mulher católica (Emma Laird). A vidinha apagada do famoso arquiteto muda ao conhecer o empresário Harrison Lee Van Buren (Guy Pearce).


É Van Buren que tira Tóth da miséria e do ostracismo, dando-lhe, ora veja, liberdade para criar um projeto arquitetônico megalomaníaco. A liberdade, conceito polifônico sempre em disputa, vai se mostrar em todas as suas contradições, a partir das condições de possibilidade dentro de um Estado em ascensão econômica e geopolítica. Ascensão que não contempla todos, apenas os mais “capazes” e de ética duvidosa.
A saga de Tóth se equilibra entre superar o trauma de guerra de imigrante num país xenófobo e deixar um legado de sua obra custe o que custar. E de quebra, tentar viabilizar a entrada de sua mulher Erzsébet (Felicity Jones) e sobrinha Zsófia para fare l’America.


Dividido em três atos, o longa de 214 minutos está longe de ser “bruto” ou “cru”. Segue a linha estética do brutalismo que se dizia “honesto” e sem ornamentos dispensáveis: os roteiristas Brady Corbet e Mona Fastvold têm o mérito inegável de escrever diálogos inspirados e densos, algo raríssimo na indústria de Hollywood.
No entanto, cai em alçapões como perfis maniqueístas e propagandísticos. Seu herói é o judeu supliciado que tenta escapar do nazismo para ser massacrado por católicos e protestantes xenófobos e pelo capitalista liberal ressentido e desprovido de talento.
Em várias sequências, a propaganda sionista se esgueira em offs e em diálogos em que a criação do Estado sionista e supremacista de Israel é algo tido como “natural”, uma vontade de Deus, e a solução para o núcleo de húngaros exilados que devem voltar para “casa”.
“O Brutalista” faz parte da leva de produções de propaganda sionista que inclui ainda “5 de Setembro” (“September 5”, de Tim Fehlbaum, 2024) e “A verdadeira Dor” (“A Real Pain”, de Jesse Eisenberg, 2024). O brutalismo na arquitetura é caracterizado como algo monumental, cujos elementos retóricos apontam para o coletivo e a racionalidade. Razão que culminaria no projeto racista do nazifascismo e que, na atual fase do neoliberalismo, surge revigorado no horizonte, entre outras frentes, no Estado de Israel.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *